A noticia caiu cínica e bruta.
Um dos melhores usuários da palavra breve em língua portuguesa, morreu.
Hoje, pela rádio, quando soube do acontecimento, disse para comigo: vai haver prosa do luso-angolano.
Aqui está ela com o modo que a bruteza da morte do seu mestre pede.
E mais não digo.
Repito só o prosear de FêFê:
"Noutro ponto deste jornal e hoje, já escrevi sobre Millôr Fernandes. Espero que ninguém me vá cobrar por voltar aqui ao mesmo sujeito. Quando se repete tanto sobre gente que voa baixinho (e se lhe dá páginas e minutos em telejornais) até é indecente contar o espaço dedicado ao maior génio da nossa língua condensada. Ninguém inventou tantas e boas frases. Mas há outra razão para voltar à carga. Acabo de ler o testemunho de Luis Fernando Veríssimo, dado ao jornal O Globo, do Rio de Janeiro. Ele conta uma sessão literária em que participou com Millôr e na qual este leu um discurso belo e comovedor. O tema era sobre democracia e direitos humanos. No fim, depois do silêncio de todos, que interiorizavam a beleza do que tinham acabado de ouvir, Millôr fez um acrescento: o discurso era do general Garrastazu Médici. Sim, do ditador que governou no período mais repressivo da História do Brasil. Millôr tem trinta livros, milhares de frases e viveu dos jornais, enfim, da palavra. E foi ali para dizer: cuidado com ela. Dei-me conta, lendo o testemunho de Veríssimo, que o cinismo de tantas pérolas de Millôr não era truque de poseur. Era aviso. Frase dele, recolhida na colectânea Millôr Definitivo: "Prudência: e devemos sempre deixar bem claro que nenhum de nós, brasileiros, é contra o roubo. Somos apenas contra ser roubados." Foi a ser cínicos que eles nos andou (e não só aos brasileiros) a ensinar ser."
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. The End