Sexta-feira, 12 de Agosto de 2011

Ainda o 25 de Novembro de 1975

É das questões mais controvertidas da nossa história politica do século XX e da "revolução".

Ainda hoje o papel do Partido Comunista Português, e não só, está mergulhado numa névoa espessa, donde, provavelmente, nunca sairá.

A historiadora da Universidade Nova de Lisboa, Raquel Varela publica, em forma de livro, a sua tese doutoral dedicada, precisamente, "A história do PCP na revolução dos cravos" e publicada com a chancela da Bertrand Editora.

Defende, de modo algo singular, que o PCP não "montou", ou "urdiu", um plano militar para tomar o poder em 25 de Novembro de 1975.

Contudo, cita outros argumentos, outras abordagens.

"Inácia Rezola, cuja análise sobre a actuação do PCP no golpe é inconclusiva, mas aponta para a tese do «recuo do PCP», escreve também que no fim da tarde de 25 de Novembro «começava a tornar-se óbvia a ausência de uma liderança consensual, de um plano e de uma coordenação das acções dos sublevados.»"

Mais adiante, a pp. 343 da obra em apreço, Raquel Varela escreve algo, verdadeiramente "delirante", e cito: "E, finalmente, não permitem a saída dos fuzileiros, dirigidos pelo partido. O PCP recusa a distribuição de armas a centenas ou milhares de militantes e simpatizantes que, junto das sedes do PCP e das unidades militares, as pediam. E quer as movimentações no RALIS, como na EPAM, como na PM, dirigidas por sectores de esquerda, nas duas primeiras afectos ao PCP, não são acções provocadas pela esquerda mas em resposta às acções da direita."

Varela continua a argumentar contra a tese da sua colega Rezola, que, esta sim, sustentando a tese do "recuo" admite a existência, por parte do PCP de um plano golpista. Ouçam-na aqui: "A ser verdade a tese do «recuo», teríamos de concluir por uma direcção inoperante e estrategicamente desnorteada, que durante quatro meses mobiliza os militantes para uma solução militar - ainda nos jornais das vésperas de 25 de Novembro - e, de repente, põe em execução essa solução militar. A tese do «recuo» não tem fundamento porque pressupões que o PCP preparou um golpe de estado sem um comando militar operacional para o mesmo."

É interessante, no livro da historiadora, a tese de que terá havido um "acordo" entre o Grupo dos 9 e o PCP. Sabe-se, de fonte segura que, Nuno Brederode, cedeu a casa, a sua, na Estrada das Laranjeiras, para um encontro entre Ernesto Melo Antunes e Álvaro Cunhal em vésperas do 25 de Novembro... Álvaro Cunhal não nega este encontro. Melo Antunes confirma-o, mas nunca deu detalhes sobre o mesmo. Não afirma a existência de um acordo, de qualquer tipo de acordo, mas também não o nega.

Contudo, e cito Raquel Varela: "No dia 26 de Novembro, Ernesto Melo Antunes vai à televisão dizer que o PCP é indispensável para construir a democracia portuguesa e, contra o PS e sectores mais à direita, recusa a ilegalização do partido, que permanece na composição do VI Governo Provisório."

Já temos material para conversar.

Há um dado que é incontornável.

Milhares de militantes do PCP tinham feito a guerra colonial. Outros, mais novos, faziam parte do quadro profissional das FFAA, ou dos conscritos, na altura do 25 de Novembro. O Sector A do PCP, dirigido por Jaime Serra, coordenava, não só os militares no activo, como possíveis operações "militares" a realizar por quadros partidários civis.

No dia 24 de Novembro, sobretudo em Lisboa e na margem sul do Tejo, até Alcácer do Sal..., milhares de militantes tiveram G3's em sua posse, ficando a aguardar instruções para avançar. Militantes comunistas, concentrados perto do Largo do Rato, designadamente, estiveram em estado de prontidão, armados, para avançar para Monsanto, com a missão de "barrar" o avanço dos homens de Jaime Neves.

Nesse entretanto, Miguel Judas, o tenente Judas, com o operacional da ARA, Raimundo Narciso, então n.º 2 do Sector A (este já  escreveu sobre este tópico...) estavam à porta de armas de Vale de Zebro a tentar convencer os Fuzileiros a saírem... A resposta destes: -Se tivermos ordens do nosso Almirante (Rosa Coutinho...) avançamos.

Não é, pois, o PCP que não deixa sair os Fuzileiros, mas estes, que, sem comando, não avançam.

A 27 de Novembro de 1975, Álvaro Cunhal, no salão do Hotel Vitória, num plenário de centenas de quadros sindicais, afirma: - O careca teve medo. Encolheu-se. A contra-revolução ganhou.

Ora, este careca, era, nem mais nem menos, o Almirante Rosa Coutinho.

Vasco Lourenço, já o escreveu, também, estando nessa madrugada às ordens do PR, Costa Gomes, em Belém e em articulação com o PC da Amadora, comandado por Ramalho Eanes, manda o conselheiro da revolução, Comandante Martins Guerreiro (que se julgava detido...) "parar os fusas, que estarão a avançar sobre Lisboa...".

Às 4 horas do dia 25 de Novembro de 1975, TODAS as armas (ou quase; pois há uma "brigada" de Alcácer do Sal, dirigida por um quadro profissional do PCP, regressado fazia pouco tempo de Paris, funcionário comunista, farto de esperar, sem ordens de António Gervásio, avança em direcção a Almada...armado de G3's) são mandadas recolher, aos milhares, e os militantes são desmobilizados. O PCP "recua" e apaga todas as "pegadas" de "movimentações" paramilitares inconsequentes.

O que podemos então concluir?

Cunhal sabe que não tem condições para avançar com um golpe militar, por razões tácticas e ainda estratégias (Portugal não podia sair do âmbito da NATO). Mas sabe que há duas unidades militares que podem desequilibrar a situação. Uma, nas mãos do Grupo dos 9 e da direita spinolista, os Comandos (não a unidade de então, esta controlada pelo miliciano comunista António Vilarigues...), mas os operacionais das guerras coloniais, arregimentados, entre outros, por Castro Caldas e concentrados na Amadora. A outra, nas "mãos" dos comunistas, os Fuzileiros de Vale de Zebro.

Depois, há dois aspectos ainda pouco estudados e que, Raquel Varela, praticamente, não aflora.

O bloco de centro, esquerda e direita, tinha um Plano Defensivo, o que se desenrolou na madrugada de 25 de Novembro, com a movimentação dos Comandos e que parou a 25 de Novembro. Mas, tinham também, um Plano Ofensivo. Onde é que estava ele? Quem o comandava? Que unidades estavam em prontidão?

Sabe-se que Jaime Neves, aos berros, na Amadora exigia a ilegalização do PCP e da Intersindical e queria avançar... com o tal plano ofensivo?! Mistério.

Diz-se que, Ramalho Eanes travou-o, militarmente falando.

Depois, temos a ida Melo Antunes à televisão.

Ainda no dia 25 de Novembro, o Grupo dos 9 discute a situação politica. Agora, era preciso "travar" a direita revanchista, acobertada atrás do PS de Mário Soares. É Vasco Lourenço que sugere o nome de Melo Antunes para ir fazer a declaração sobre o PCP à RTP. Este, ter-lhe-á retorquido "estou queimado para sempre".  A história, o futuro, deu-lhe razão.

A "normalização" das FFAA's fazem-se com o afastamento das chefias militares de esquerda, esquerdistas e, logo após, do próprio Grupo dos 9. Quem vai normalizar as FFAA's são o oficialato spinolista que, porventura, estaria no comando da resposta ofensiva, que não foi necessária...no dia 25 de Novembro de 1975.

Como se percebe, ainda há muita névoa em torno do 25 de Novembro de 1975.

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publicado por weber às 12:53
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