O Expresso, sempre preocupado com o fragor, a actualidade e o seu "comprometimento" com o verbo "mudar" deu a Capa da ÚNICA ao SG dos comunistas.
Porquê, e agora?
Vá-se lá saber.
Mistérios que a comunicação social tece.
É, para mim, irrelevante, o ângulo que os autores da façanha, Ricardo Costa e Pedro Mexia (curiosa dupla) escolheram para mostrar o homem.
Ninguém ainda, desde que está SG do PCP, lhe descascou a pele de politico, enquanto militante da Comissão de Freguesia de Sacavém, de Coordenador da CIL (cintura industrial de Lisboa), de deputado, de quadro permanente do PCP.
Alguém o fará, um dia.
Sabe-se que não gosta de ler.
Sabe-se que é (ou foi) um mulherengo militante.
Sabe-se que mantém uma família tradicional.
Sabe-se que gosta de jogar às cartas, de dançar, de lançar a malha, de comer e de beber.
Sabe-se que mora em Piriscoxe.
Gostava de acampar no parque de campismo da praia do Malhão, propriedade do SITAVA, sindicato da aviação.
Mas falemos, sobretudo, da ignorância do nosso homem.
A tradição no seio dos comunistas já não é o que era.
Desde sempre, o leninismo defendia e defende, que a consciência de classe, no interior do proletariado, deveria vir de fora, da intelectualidade marxista.
Assim ocorreu sempre.
Veja-se o caso português.
Bento Gonçalves, operário especializado do Alfeite, dizem, quem com ele privou, que era uma enciclopédia viva: matemáticas, física, mecânica, línguas, filosofia e, naturalmente, marxismo, tudo isto ele dominava. Conhecia-se, na época, pouco Lenine. Sabia-se, entretanto, da revolução russa.
Álvaro Cunhal, licenciado em direito, conhecedor de muitas línguas, história, economia, escritor, pintor, gráfico e organizador de truz.
Carlos Carvalhas, economista, pouco culto, mas ainda assim competente e modesto politico.
O actual SG, operário metalúrgico.
Sobe a pulso, por que é intuitivo, com uma retórica mais ou menos consistente.
Funciona como uma esponja.
Assimila, rapidamente, o que precisa de saber, para intervir, nos debates, nas discussões.
Sempre viveu, em termos intelectuais, da parasitagem dos outros.
O modo como utiliza a sabedoria popular, os aforismos ("farinha do mesmo saco", "não bate a cara com a careta", etc) são uma imagem de marca deste semianalfabeto e dão-lhe um ar popular e genuíno.
Eu sou do tempo em que os operários, que se queriam alcandorar a postos de chefia nos Partidos Comunistas estudavam que se desunhavam.
Veja-se, só no caso português, Bento Gonçalves, Domingos Abrantes, Pires Jorge, Edmundo Pedro, António Gervásio, Dinis Miranda, quase analfabetos, mas que dominavam línguas, as matemáticas, a astronomia, conheciam a estilística do português e, sobretudo, devoravam Lenine.
Cunhal era, sobretudo, leninista. Quase que nunca citava Marx.
Em nenhum escrito mistura marxismo com leninismo. Nunca escreveu, ou pronunciou, marxismo-leninismo, ou articulou "ideologia marxista-leninista". Isto não existe.
O seu "contributo" teórico no comunismo internacional, e em Portugal, foi exclusivamente numa área de competências: criação de um partido leninista, centralismo democrático, revolucionário, com uma "moral" revolucionária. Formatação e criação do "quadro revolucionário profissional". Gramsci falava do "intelectual órgânico" quando indicava os filhos da burguesia, literatos, que se dedicavam à revolução proletária.
A Cunhal não se lhe conhece um único texto teórico marxista, mas sobre o Partido, sobre a Revolução, sobre as politicas, a história, dezenas e dezenas de trabalhos estão publicados.
No caso português, no pós 25 de Abril, só Luís Sá se destacou na produção de pensamento marxista sobre realidades novas no Estado e na União Europeia. Produziu uma nova platafoma politico-ideológica, "O Novo Impulso", que foi objecto do segundo golpe de Estado de Cunhal no PCP. O primeiro ocorreu contra Fogaça, a seguiur ao Vº Congresso, que aprovou a solução pacifica para o derrube do fascismo.
Cunhal sustentava que Luís Sá não era leninista...e tinha razão.
Jerónimo é da escola leninista, mas sem saber teórico, sem ter lido nunca os textos do mestre.
Pode ter lido algum Cunhal, mas estamos a falar da "vulgata" leninista.
É por tudo isto que é delirante a parte da "entrevista" em que ele fala do "marxismo e do leninismo".
As afirmações são dele:
"Não. Nós não separamos Marx de Lenine, o marxismo e o leninismo não se separam...".
"Não, o marxismo e leninismo não se separam. Este Partido Comunista Português tem uma ideologia marxista-leninista, mas também é um partido com uma experiência própria, sempre muito ligado aos problemas dos trabalhadores e do nosso povo."
O que é que isto tudo, este arrazoado, quer dizer?
Ladainhar, ladainhar.
Faz lembrar aqueles católicos, que repetem as fórmulas, sem nunca terem lido a Bíblia, uma vez que fosse.
Imagina-se Jerónimo de Sousa a ler o Capital de Marx, ou a Origem da Família, ou o Feuerbach de Engels? Ou até o Que fazer?, ou o Imperialismo Estádio Supremo do Capitalismo, ou o Materialismo e Empirocriticismo de Lenine?
Jerónimo é o paradigma do "portuga" videirinho, filho do "desenrasca", ladino, sem-vergonha, capaz de se iludir a si próprio.
O espantoso é que tal funciona, na tribo e no eleitorado dos comunistas, que ele tem vindo a segurar.
Mas, como o PCP é um partido demográfico, à medida que vão "morrendo", vão minguando, também, em termos eleitorais.
A ver vamos.
NB - Já depois de ter escrito este texto, militante comunista das minhas relações, sustentava que "o Partido está a viver um desvio obreirista, como já há muito tempo não ocorria".
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. The End